BRUNA SANTOS DE OLIVEIRA
O gênero Ficus pertence à família Moraceae e abrange aproximadamente 1.000 espécies, a maioria das quais de interesse apenas para a jardinagem. A variedade de figueira (Ficus caricae – Moraceae) mais plantada no Brasil é a Roxo de Valinhos, devido à sua alta produtividade, precocidade, vigor, rusticidade e excelente qualidade dos frutos, com boa aceitação tanto pela indústria quanto pelo consumidor na forma “in natura” (Marchi et al., 2010).
A doença mais importante dessa cultura é a ferrugem Cerotelium fici (Castagne) Arthur, que foi constatada pela primeira vez no estado de São Paulo há mais de 90 anos e hoje pode ser encontrada em todas as áreas de cultivo de figueira. Os danos causados pela ferrugem podem ser elevados, da ordem de 80% ou mais na produção, especialmente nos casos onde não é feito o controle do patógeno e quando há condições favoráveis ao seu desenvolvimento. O fungo causador da doença pode parasitar, além da figueira, outras plantas do gênero Ficus (Kimati et al., 2005).
Segundo os dados do Systematic Botany of Mycological Resources (Farr & rossman, 2010) de levantamento de fungos no mundo, demonstraram que nos países: Argentina, Austrália, Açores, Baleares, Barbados, Bermuda, Brasil, Ilhas Canárias, Cabo Verde, China, Colômbia, Congo, Costa Rica, Cuba, Chipre, Republica Dominicana, El Salvador, Florida; França, Grécia, Guatemala, Havaí; Hong Kong, Índia, Indonésia, Jamaica, Japão, Quénia, Líbia, Madeira Islands, Malawi, Maurícias, Marrocos, Mississipi, Nova Caledônia, Nova Zelândia, África do Norte, Paquistão, Nova Guiné Papua, Peru, Filipinas, Porto Rico; Sul África, África do Sul, Taiwan, Tanzânia, Trinidad e Tobago, Uruguai, URSS, Venezuela, Ilhas Virgens e Zimbábue, foram identificado o fungo Cerotelium fici associado à espécie hospedeira Ficus carica.
Esse trabalho tem como objetivo descrever aspectos relacionados à sintomatologia, etiologia, epidemiologia e controle da ferrugem da figueira.
Amostras de folhas de figo procedentes do município de Ipameri e Urutaí – Goiás foram encaminhadas ao Laboratório de Microbiologia do Instituto Federal Goiano – campus Urutaí em março de 2010.
A técnica utilizada para a diagnose da doença foi a remoção de urediniósporos por raspagem de algumas folhas contendo os sinais do patógeno. A técnica utilizada chama-se “pescagem direta”, que consiste em raspar as folhas com o auxílio da agulha (seringa), depositar o tecido com sinal na lâmina com o corante e posteriormente a deposição da lamínula. A diagnose da doença e a identificação do patógeno foram feitas com base nos sintomas e na observação das estruturas fúngicas em microscópio ótico, com aumento de 10x e 40x (Figura 1.A).
Foram realizados cortes histológicos, utilizando fixador a base de azul-de-algodão. Na superfície da lâmina contendo o fixador, depositaram-se os cortes, em seguida uma lamínula. A finalidade do corte histológico foi de mostrar a interação do patógeno com a planta (Figura 1.F).
Os sintomas da planta foram fotografados, primeiramente utilizando microscópio estereoscópio (lupa) e os sinais foram microfotografados utilizando câmera digital Samsung, para a confecção da prancha de fotos.
Hospedeiro/cultura: Figo (Ficus carica L.).
Família Botânica: Moraceae
Doença: Ferrugem-do-figo
Agente Causal: Cerotelium fici (Cast.) Arth.
Local de Coleta: Município de Ipameri-GO
Data de Coleta: 10/03/10
Taxonomia: Pertence ao Reino Fungi, Divisão Basidiomycota, Classe Pucciniomycetes, Ordem Pucciniales, Família Pucciniaceae (ou Phakopsoraceae), Gênero Cerotelium (Index fungorum, 2010).
Sintomatologia: Os sintomas se manifestam primeiramente sobre as folhas, na forma de pequenas manchas, mais ou menos angulosas, de cor verde-amarelada, que posteriormente tornam-se maiores e de coloração parda, com presença de pústulas, que ao se abrirem, expõem urediniósporos ferruginosos de aspecto pulverulento. As esporulações são pequenas e isoladas na face abaxial. Frequentemente, as folhas mais velhas são afetadas em primeiro lugar e em poucos dias (20-30), toda a folhagem pode ficar recoberta por pústulas (Figura 1.C). As folhas severamente afetadas amarelecem, secam e caem prematuramente, e quando a pluviosidade é muito elevada, a doença pode ocasionar desfolha completa da árvore apresentando período de incubação de 20 a 30 dias. Pode ocorrer ausência total de frutificação, em estágios iniciais de desenvolvimento vegetativo e também haver diminuição no processo de maturação dos frutos, no estágio de frutificação (Kimati et al., 2005).
As folhas apresentavam manchas amareladas na face abaxial das folhas, de formas e tamanhos variáveis (Figura 1.B). As lesões na folha são pequenas necróticas e bastante distribuídas no limbo.
Etiologia (Sinais): Seus urediniósporos (fase II), estrutura assexual mais freqüente não possuem pedicelos, são globosos, providos de membrana espessa e equinulada (Figura 1.E), e medem de 18-25 x 12-22 μm (Kimati et al., 2005).
As sinonímias do nome atual Cerotelium fici (Castagne) Arthur, são: Kuehneola fici E.J. Butler, Malupa fici (Castagne) Buriticá, Phakopsora fici Nish., nishidana Phakopsora S. Ito, Physopella fici (Castagne), Arthur, Uredo fici Castagne (Index fungorum, 2010).
Epidemiologia: A sobrevivência do fungo durante o período de repouso vegetativo da figueira, dá-se nas folhas afetadas que permanecem no chão. O período de repouso vegetativo da figueira é relativamente curto (maio a agosto), havendo a possibilidade de existirem folhas doentes remanescentes no pé até a época de poda (julho a agosto), quando o inverno não é muito frio e seco. Assim, o inóculo presente nas folhas no chão é disseminado durante o desenvolvimento vegetativo da planta pela ação do vento e respingos de chuva. Ao atingirem as folhas, na presença de umidade, os urediniósporos germinam (Figura 1.D), e penetram através de estômatos. Após duas semanas de deposição dos urediniósporos aproximadamente, é possível observar a presença de sintomas de ferrugem nas folhas. Aparentemente, temperaturas mais ou menos elevadas favorecem o desenvolvimento da ferrugem (Galli et al., 1980).
O agente causal da ferrugem é Cerotelium fici, um patógeno que se encontra distribuído por todas as regiões tropicais e subtropicais do mundo onde se cultiva Ficus carica. (Kimati et al., 2005).
Além de parasitar a figueira (Ficus carica L.), há relatos que o fungo também parasita em Ficus angustifolia, Ficus aurea, Ficus beecheyana, Ficus benghalensis, Ficus citrifolia, Ficus combsii, Ficus cordata subsp. salicifolia, Ficus coronata (rust), Ficus crassinervia, Ficus doliaria, Ficus elastica, Ficus erecta, Ficus esquiroliana, Ficus exasperata, Ficus formosana, Ficus gibbosa, Ficus glomerata, Ficus hirta, Ficus hispida, Ficus hochstetteri, Ficus ibapohi, Ficus involuta, Ficus laevigata, Ficus macrophylla, Ficus minahassae, Ficus mitrophora, Ficus monckii, Ficus odorata, Ficus padifolia, Ficus palmata, Ficus pretoriae, Ficus pumila, Ficus radula, Ficus religiosa, Ficus retusa, Ficus salicifolia (leaf rust), Ficus semicordata, Ficus simplicissima, Ficus superba var. japonica, Ficus turbinata, Ficus vallis-choudae, Ficus wightiana e Ficus ×carica-pumila (Farr & Rosman, 2010).
Controle: O controle da ferrugem deve ser realizado basicamente em duas épocas. A primeira corresponde ao período vegetativo. Nessa ocasião devem ser eliminados todos os órgãos que possam servir de fonte de inóculo primário para a fase de desenvolvimento vegetativo da estação seguinte, inclusive as folhas afetadas no chão. As plantas também devem ser pulverizadas com calda bordalesa, que para o seu preparo, em uma quantidade de 20 litros é necessário 200 gramas de sulfato de cobre, 200 gramas de cal virgem e 20 litros de água (Florestasite, 2010). A segunda época correspondente à fase de vegetação, que vai desde a brotação até a maturação dos frutos. Nessa ocasião, toda a folhagem, principalmente aquela em desenvolvimento, deve ser protegida com aplicações de calda bordalesa a 1% espaçadas de 10 a 15 dias. Os fungicidas a base de cobre insolúvel ou sistêmicos, como os triazóis, o qual recomenda-se utilização de 20 ml para cada 100 litros de água da dose do produto (nome técnico: Tebuconazole, nome comercial: Folicur 200 CE©), também dão bons resultados, com a vantagem sobre a calda bordalesa de poder aplicá-los a baixos volumes, 200 litros por hectare (terrestre) ou 30 a 40 litros por hectare (aéreo), o que garante melhor cobertura (Sia, 2010). O fungicida Azoxystrobin (grupo químico: estrobilurina, nome comercial: Amistar 500 WG©), isoladamente utilizando-se de 96 a 128 gramas por hectare da dose do produto, ou alternado com Oxicloreto de cobre (grupo químico: inorgânico e nome comercial: Funguran 350 PM© ou Recop PM©) 200 gramas por 100 litros de água da dose do produto ou Mancozeb (grupo químico: ditiocarbamato, nome comercial: Persist 445 SC© ou Dithane PM©) utilizando 200 gramas por 100 litros de água, que também se mostrou eficiente para controle de ferrugem. Entretanto, a calda bordalesa, por sua maior tenacidade, que confere, aparentemente, certa rigidez desejável a casca do figo, é a preferida pelos produtores. Todos os produtos citados a cima são registrados pelo Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (Agrofit, 2010).
Figura 1. Ferrugem (Cerotelium fici) em folhas de figo (Ficus carica L.). A. Sintomas de ferrugem na face adaxial, B. Pústulas (sintomas típico de ferrugem) na face abaxial da folha, C. Detalhes das pústulas em microscópio estereoscópio (lupa), D. Urediniósporo germinando, E. Urediniósporos de Cerotelium fici visualizados em microscópio óptico, F. Interação do patógeno com hospedeiro.
Literatura Citada:
AGROFIT – Sistema de Agrotóxicos Fitossanitários. Disponível em: <http://extranet.agricultura.gov.br/agrofit_cons/principal_agrofit_cons>. Acesso em: 27 de junho de 2010.
FARR & ROSMAN, SBML Systematic Botany of Mycological Resources. Disponível em: <http://www.ars.usda.gov/main/site_main.htm?modecode=12-75-39-00>. Acesso em: 24 de abril de 2010.
FLORESTASITE - Calda Bordalesa. Disponível em: <http://www.floresta-site.com.br/caldabordal.htm>. Acesso em: 27 de junho de 2010.
GALLI, F.; CARVALHO, P.C.T.; TOKESHI, H.; BALMER, E.; KIMATI, H.; CARDOSO, C.O.N.; SALGADO, C.L.; KRÜNGNER, T.L.; CARDOSO, E.J.B.N.; BERGAMIN FILHO A.. Manual de Fitopatologia: Doenças das plantas cultivadas, 2ª Ed. Vol. 2. São Paulo: Agronômica Ceres, 1980.
INDEX FUNGORUM. Disponível em: <http://www.indexfungorum.org/Names/Na-mes.asp>. Acesso em: 24 de abril de 2010.
KIMATI, H.; AMORIM, L.; REZENDE, J.A.M.; BERGAMIN FILHO, A.; CAMARGO, L.E.A.; Manual de fitopatologia: Doenças das plantas cultivadas. 4ª Ed. Vol. 2, pág. 542 – São Paulo: Agronômica Ceres, 2005.
MARCHI, C.E.; RESENDE, M.L.V.; CARVALHO, V.L.; NAGIB, N.; CHALFUN, J.. Manejo integrado da ferrugem da figueira. Disponível em: <http://www.editora.ufla.br/BolExtensao/pdfBE/bol_38.pdf>. Acesso em: 24 de abril de 2010.
SIA – Sistema de Informações sobre Agrotóxicos. Disponível em: <http://www4.anvisa.gov.br/agrosia/asp/default.asp>. Acesso em: 24 de abril de 2010.
Só um detalhe a taxonomia da espécie...
ResponderExcluirCLASSE: TELIOMYCETES
ORDEM: UREDINALES
Fonte: PUTZKE & PUTZKE
Rochele de L.G. Rosa- GRADUANDA DO CURSO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DO RIO GRANDE DO SUL
Contato: rochele.lourdes@acad.pucrs.br
Olá, Rochele. Creio que isso tem a ver com a nova e antiga nomenclatura, e não um equívoco. Como graduandos sei que aprendemos a nomenclatura antiga, pois aparentemente ela é mais fácil de ser usada em sala de aula, mas temos que estar cientes da atual.
ResponderExcluirQuanto a discussão sobre classes, até 1968 usava-se o nome Teliomycetes (P.H.B. Talbot). Em 1983 as ordens Uredinales e Ustilaginales foram elevadas a classes: Urediniomycetes e Ustilaginomycetes por Hawksworth et al. Em 2006 ocorreu a última troca e adoção de nomes, para Pucciniomycetes (R. Bauer, Begerow, J.P. Samp., M. Weiss & Oberw).
Já sobre as ordens, Ordem Pucciniales era previamente Uredinales. Uredinales era de G. Winter (1880) e a partir de 1931 passou a ser Pucciniales por Clements, F.E.; Shear, C.L.
Fontes: 1) University Botany I : (Algae, Fungi, Bryophyta And Pteridophyta), Volume 1, By S.M. Reddy
2) http://nzfungi2.landcareresearch.co.nz
Juliana Glufke Salomé
Engenheira Agrônoma pela Universidade Federal de Santa Catarina
"Quanto a discussão sobre classes, *a partir de* 1968 usava-se o nome Teliomycetes"
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