segunda-feira, 2 de maio de 2011

Ferrugem Marrom (Puccicia melanocephala) incidente em folha de Cana-de-açucar(Saccharum sp.)

Maurílio de Sousa Netto

Acadêmico do curso de Agronomia

1. INTRODUÇÃO

As ferrugens representam um grupo de doenças em que os agentes causais pertencem ao Reino Fungi divisão Basidiomicota classe Teliomicetes ordem Uredinales, e família Pucciniaceae. Atualmente existem 5251 espécies de Puccinia sp. registradas e válidas em literatura (Index Fungorum, 2011).

Existem duas variedades hospedeiras registradas em literatura para Puccinia melanocephala Syd. & P. Syd. 1907 no Brasil: Saccharum officinarum Linn. (Gramineae), pode ocorrer em sementes e concentra maior incidência nos estados de SP, PB, CE, MG, PE, RN e Saccharum spp., ocorre também em sementes (Embrapa Cenargem, 2011).

Existem no mundo vinte e três variedades hospedeiras, estas encontradas na Ásia, África, Índia, Europa e nas Américas, sendo que a hospedeira S. officinarum é a que apresenta maior número de relatos, ocorrendo em 20 países (Farr & Rossman, 2011).

Os Basidiomicetos caracterizam-se por produzir esporos de origem sexual exógenos, diferenciando dos Ascomicetos que também produzem esporos sexuais, contudo inseridos internamente dentro de ascas. Os Basidiomicetos, assim como os Ascomicetos, distinguem-se dos Ficomicetos por apresentarem micélio ceptado. Os basidiósporos usualmente são uninucleados e haplóides, sendo resultado da plasmogamia, cariogamia e meiose. As duas últimas fases ocorrem no interior da basídia, estruturas pelas quais os basidiósporos são produzidos. Os basidiomicetos que ocasionam doenças do tipo ferrugem, não produzem basidiomas e seus representantes pertencem a ordem Uredinales, são todos parasitas obrigatórios amplamente presentes e especializados ao tecido de seus hospedeiros. Os representantes da família Pucciniaceae caracterizam-se por produzirem teliósporos uni, bi ou multicelulares, isoladamente ou em pequenos grupos de dois ou três em um pedicelo. Os teliósporos nunca são unidos lateralmente formando crostas ou colunas, podendo ou não ser hiperparasitados (Darluca sp.). As paredes desses esporos são espessas e ainda, o teliósporo (esporo sexual) pode ser envolvido por uma bainha transparente, lembrando uma cápsula que reúnem algumas dessas estruturas. Teliósporos bicelulares caracterizam fungos pertencentes gênero Puccinia(Galli et al., 1978).

Na maioria dos gêneros de ferrugens, os teliósporos são organizados em télios bem diferenciados. Porém, em alguns gêneros, essa organização é irregular e o termo é mais aplicado pelo propósito de uniformidade. Assim, por definição, os teliósporos sempre germinam produzindo basídios. Os télios e os teliósporos são as estruturas empregadas para a identificação e classificação das formas teleomórficas ou “perfeitas” das ferrugens.

Entretanto, muitas ferrugens, mesmo pertencendo ao grupo que requer dois hospedeiros diferentes para seu ciclo completo, podem sobreviver em um único hospedeiro por meio de reprodução vegetativa ou clonal (urediniosporos). No caso das ferrugens denominadas autoécias, em que todos os estados esporíferos manifestam-se em um mesmo hospedeiro, a determinação dos ciclos de vida deveria ser mais simples, não fosse a grande variabilidade existente em certas espécies. Nestas, a morfologia das estruturas esporíferas e esporos não coincidem com as funções normalmente desempenhadas no ciclo vital das ferrugens mais bem estudadas.

Os uredínios são formados a partir do micélio dicariótico e formam esporos dicarióticos, denominados urediniósporos. Estes se originam por simples segmentação da parte final de uma hifa não ramificada e que é freqüentemente referida como pedicelo. Uma segunda geração de uredínios e de urediniósporos pode resultar de uma infecção por urediniósporos e são, por isso, chamadas estruturas repetitivas, funcionando como conídios. Esse tipo de reprodução é, também, chamado de anamórfica ou clonal, por repetir exatamente as características genéticas da geração anterior. Na maioria das ferrugens, os uredínios não são limitados por quaisquer estruturas peridiais. Em algumas ferrugens, entretanto, são encontradas células marginais não esporogênicas que limitam o soro e que são denominadas paráfises. As paráfises apresentam formas variáveis podendo ser clavadas, capitadas etc. e, usualmente, apresentando a parte apical com paredes espessadas. Essas estruturas são, freqüentemente, utilizadas na sistemática para separação de gêneros e/ou espécies. Algumas espécies de ferrugens podem apresentar uredínios com urediniósporos catenulados como é o caso do gênero Coleosporium. Os urediniósporos são muitas vezes capazes de germinar sem que haja qualquer período de repouso, desde que haja condições ambientais favoráveis. Essa germinação ocorre através de poros denominados poros germinativos. Em muitas espécies , porém os urediniósporos possuem substâncias autoinibidoras ou estimuladoras que, dependendo de vários fatores ambientais, impedem ou controlam a germinação, mesmo que as condições ambientais sejam favoráveis. Todos esses fatores envolvidos nos processos de germinação dos diferentes tipos de esporos das ferrugens são os responsáveis pelas complicados mecanismos de sobrevivência das diferentes espécies.Os urediniósporos são binucleados e, via de regra, unicelulares sendo suas superfícies usualmente ornamentadas delicadamente, equinuladas, ou verrugosas de forma uniforme ou não. A posição e o número de poros germinativos presentes nos urediniósporos, e que nem sempre são facilmente visíveis, são razoavelmente constantes para uma determinada espécie e, por isso mesmo, são características úteis para a identificação das ferrugens através de seu estado anamórfico clonal. Quanto a posição nos esporos, os poros germinativos podem ser: dispersos, equatoriais, unizonados, bizonados, supra equatoriais ou basais, hospedeiro e espessura das paredes na parte distal ou basal, são elementos que também auxiliam na identificação das espécies ( Figueiredo & Passador, 2008).

A ferrugem-marrom que tem como agente etiológico P. melanocephala, chegou ao Brasil em 1986, oito anos após sua chegada a América Central, vinda da África por correntes aéreas. A doença é favorecida por temperaturas amenas e altas umidades, sendo que, o curto ciclo de vida do fungo, permite o desenvolvimento rápido de epidemias e dentro de 5 a seis semanas, a cultura, de aspecto inicialmente verde, se torna avermelhado devido à formação maciça de pústulas nas folhas (Ryan e Egan, 1989).

As folhas atacadas exibem pústulas salientes, sintomas típicos de algumas ferrugens, com rompimento da epiderme. Estas pústulas apresentam coloração amarelada a marrom-escura, em função da massa de urediniósporos. A presença das pústulas reduz a atividade fotossintética resultando na redução do crescimento e queda de produção. Os prejuízos são representados pela redução do desenvolvimento dos colmos, em conseqüência da alta infestação da doença nos primeiros meses de desenvolvimento da cultura.

Como toda ferrugem, é facilmente dispersa pelo transporte dos urediniósporos pelo vento e respingos de chuva, e a grandes distâncias, por meio de toletes contaminados. Este caso é o que ocorreu no Brasil, há mais de 30 anos ocorre a importação de genótipos asiáticos de cana para plantio e melhoramento nas Américas (Os mitos, 2004).

Este trabalho tem por objetivo descrever a ferrugem marrom da cana-de-açúcar enfatizando aspectos de sintomatologia, etiologia, epidemiologia e controle.

2. MATERIAIS E MÉTODOS

Foram coletadas folhas de cana-de-açúcar (Saccharum officinallis) na fazenda Bonsucesso Barreirinho, localizada no município de Urutaí, Goiás e encaminhadas para o Laboratório de Microbiologia do Intituto Federal Goiano campus Urutaí.

Foram realizados vários procedimentos técnicos para a identificação do fungo presente na folha de cana-de-açúcar. As amostras no laboratório foram analisadas inicialmente em microscópio estereoscópio, sendo verificada a presença de sinais urediniais. Logo após, permaneceram incubando em condições de câmara úmida.

Esse procedimento consistiu na inserção de fragmentos da folha no Gerbox contendo papel filtro previamente umedecido com água destilada além de borrifagem na superfície da folha.

Após 48 horas retiraram-se os fragmentos de folhas do Gerbox, sendo estas analisadas em microscópio estereoscópio para possível visualização de germinação uredinial e telial.

Com auxílio do microscópio estereoscópico foi preparado cortes transversais do mesófilo foliar das folhas apresentando urédias, para observação da interação patógeno-planta.

Preparou-se lâminas semi-permanenetes pelo método de “pescagem direta” para análise em microscópio óptico. Usando uma lâmina com uma gota de fixador, raspou-se as estruturas das pústulas com auxílio de uma pinça na para montagem e posterior identificação do patógeno. Assim usamos uma lâmina contendo uma lamínula a ser montada, vedada com esmalte e levada ao microscópio para visualização.

Após a visualização da lâmina em microscópio ótico, identificaram-se as estruturas e através destas foi possível sua identificação. As estruturas do fungo foram posteriormente micro fotografado com auxílio de uma câmera digital marca Canon modelo Power Shot SD750, do professor Milton Luis Paz Lima sendo transferidas as imagens para um computador.


3. RESULTADOS E DISCUSSÃO

Hospedeiro/cultura: Cana-de-açúcar (Saccharum officinallis ).

Família Botânica: Poaceae

Doença: Ferrugem marrom da cana-de-açucar

Agente Causal (Teleomorfo): Puccinia melanocephala Syd. & P. Syd. 1907.

Local de Coleta: Fazenda Bomsucesso Barreirinho.

Data de Coleta: 20/03/11

Taxonomia: Reino Fungi divisão Basidiomicota classe Teliomicetes ordem Uredinales, e família Pucciniaceae.

Sintomatologia

As pústulas na página inferior das folhas são amareladas a marrom-escuro, medem de 2 a 7mm de comprimento por 1mm de largura e mostram a formação de esporos subepidérmicos com ruptura da epiderme para sua liberação (Figura 1C). Em variedades muito suscetíveis, as pústulas agrupam-se formando placas de tecido necrosado. Plantas muito atacada têm crescimento retardado com folhas queimadas e sem brilho (H. Kimati et al., 2005).

Etiologia

P.melanocephala produz uredósporos marrom-escuros, ovóides a elipsóides, desnsamente equinulados, com 4 a 5 poros germinativos equatoriais (Figura 1D). Os teliósporos podem se formar isoladamente ou em pústulas urediniais. São clavados, bicelulares, com a célula distal dilatada, parede espessa e ligeiramente constritos no septo. São lisos, marrom-escuros, com a célula basal mais clara, pedicelada (Figura 1G). Os teliósporos são capazes de germinar e produzir basidiósporos, os quais não infectam folhas de cana-de-açúcar indicando que P.melanocephala não é autoécio e, portanto, deve ter hospedeiro alternativo (H. Kimati et al., 2005).

Epidemiologia

O fungo P. melanocephala é um parasita obrigatório. A germinação dos urediniósporos é favorecida pela presença de água na superfície da folha e temperaturas moderadas. Os esporos necessitam de mais de 8 horas de água livre na superfície da folha para infectar, enquanto que as temperaturas ótimas para a germinação são entre 20 e 25ºC. A suscetibilidade do hospedeiro varia segundo o estado de desenvolvimento, sendo maior entre 2 e 6 meses. Altos níveis de adubação nitrogenada podem aumentar a severidade da doença (H. Kimati et al., 2005).

A irrigação na cultura da cana-de-açúcar pode incrementar a sua produtividade, entretanto tal alteração ambiental favorece patógenos foliares, dentre eles o Urediniomicete P. melanocephala que pode reduzir em até 50% a produtividade de variedades suscetíveis (Parreira et al., 2009).

Realizaram-se 2 ensaios em Jaú - SP para avaliar a resistência de 15 clones IACSP de cana-de-açúcar a P. melanocephala (Ferrugem) e a U. scitaminea (Carvão), respectivamente. Empregou-se 3 variedades que funcionaram como padrões de resistência e suscetibilidade aos patógenos. As avaliações de ferrugem e carvão foram feitas após o primeiro corte por meio de escala de notas variando de 1 (resistente) a 9 (suscetível) e pela porcentagem de perfilhos com chicotes de carvão, respectivamente. A produtividade dos clones foi estimada por meio do cálculo de toneladas de colmos por hectare (TCH). No ensaio de ferrugem, verificou-se que os clones com maiores produtividades (TCH) foram aqueles com maiores níveis de resistência (Santos et al., 2005)

Controle Cultural

Apesar de o controle químico ser a principal ferramenta usada pelos produtores rurais, o controle cultural também auxilia nos processos de produção da cana-de-açúcar. Os principais aspectos a serem relacionados são: o bom preparo do solo, o histórico da área a ser plantada visando o melhor manejo a ser implantado, a época do plantio,combate as plantas daninhas, que pode se hospedeiras de alguns fungos patogênicos, entre outros.

Controle Químico

A adoção deste controle requer alguns cuidados para o sucesso da aplicação e eficiência do controle, tais como: escolha do fungicida (contato ou sistêmico), horário da aplicação (fatores climáticos), forma da aplicação (jato dirigido ou pulverizado) e intervalos entre aplicações.

Existe atualmente um produto registrado no Ministério da Agricultura para o controle químico da ferrugem marrom (P. melanocephala) em cana-de-açúcar: Priori Xtra.

O PRIORI XTRA - azoxistrobina (estrobilurina) + ciproconazol (triazol) é um fungicida sistêmico, usado em pulverizações preventivas, para o controle de doenças da parte aérea das culturas do algodão, café, cevada, girassol, milho, soja e trigo , bem como no tratamento industrial de mudasse aplicação no sulco de plantio de cana-de-açúcar.

Para a cultura da cana-de-açúcar, utilizar volume de calda de 100 L/ha. Utilizar pulverizadores acoplados às plantadoras mecanizadas ou máquinas especificas para fechamento do sulco (tampador), imediatamente antes do fechamento.

Para tratamento industrial de propágulos vegetativos (mudas de cana-de-açúcar), aplicação através de tratamento industrial, pela empresa registrante, de propágulos vegetativos (mudas) antes do plantio na cultura da cana-de-açúcar. É VEDADA QUALQUER OUTRA MODAUDADE DE USO.

Intervalo de segurança (período de tempo que deverá transcorrer entre a última aplicação e a colheita): cana-de-açúcar 30 dias, cana-de-açúcar (1), cana-de-açúcar (2).

(1) Intervalo de segurança não determinado devido à modalidade de emprego (aplicação no sulco de plantio).

(2) Não determinado devido à modalidade de emprego (tratamento de propágulos vegetativos - mudas).

Outras restrições a serem observadas:

A azoxistrobina é extremamente fitotóxica para certas variedades de maçãs e por essa razão, não pulverizar o produto quando a deriva da pulverização possa alcançar macieiras. Não use equipamentos de pulverização que tenham sido usados previamente para aplicar PRIORI XTRA, para pulverizar macieiras. Mesmo resíduos do produto que tenham permanecido nos equipamentos podem causar fitotoxicidade inaceitável para certas variedades de maçã (Agrofit, 2011).

Controle Biológico

O fungo denominado Darluca filum (Biv. Bem. Ex Fr.) Berk. tem sido encontrado em pústulas de ferrugem e, segundo Germn et al. (1986), pode ser um agente de controle biológico. Ocorre como estruturas escuras localizadas no centro das pústulas de ferrugem, na face inferior das folhas (Castro et al., 2004).

Controle Genético

O uso de variedades resistentes é o mais eficiente método desse controle. Há possibilidade de se cultivar variedades com resistência intermediária ou mesmo suscetível, em regiões de escape onde o ambiente é desfavorável ao patógeno (H. Kimati et al., 2005).

Com o objetivo de avaliar a reação de variedades e de clones de cana-de-açúcar oriundas do Programa de Melhoramento Genético da RIDESA, foi estudado o comportamento de 13 genótipos na Usina Pedrosa, mata sul de Pernambuco, onde as condições de temperatura e umidade são favoráveis ao desenvolvimento da doença. As avaliações foram realizadas aos 3, 6 e 9 meses de idade após o plantio.

Nas avaliações foi adotada escala diagramática de severidade para cana-de-açúcar em cinco plantas, considerando-se a nota de maior freqüência na folha +3. Dos 13 genótipos avaliados, dez apresentaram reação de susceptibilidade a moderadamente resistente, com comportamentos diferenciados em relação às três épocas avaliadas. Os clones RB963034 e RB972655 apresentaram as maiores notas de severidade da doença, sendo susceptíveis em todas as épocas, ao contrário de RB972503 que apresentou as menores notas, comportando-se como altamente resistente a ferrugem durante todas as épocas de avaliação (Chaves et al., 2009).

Figura 1. Ferrugem marrom (P. melanocephala) incidentes em folhas de cana-de-açúcar (S. officinallis). A.B. folha e planta de cana-de-açúcar (S. officinalis) apresentando lesões de formato elíptico com halos vermelho-amarelados, C. epiderme rompida do tecido apresentando pústulas incidentes no tecido (seta) (bar = 10 mm), D. urediniósporos apresentando dois poros germinativos equatoriais (seta), (bar = 10,7 µm), E. urédia contendo urediniósporos imaturos e hialinos (barr = 500 μm), F. G. detalhes de urediniósporos em vários estados de maturação (barr = 500 μm), H. urediniósporos apresentando cor marrom canela a marrom escuro, sem espessamento apical (barr = 10,7 µm), I.J.K. corte transversal do mesófilo foliar.,i. célula urédiogênica.



LITERATURA CITADA

AGROFIT Sistema de Agrotóxicos Fitossanitário. , acessado em 15/04/2011.

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